Desenho de sistemas de disputas

Escrevi um artigo anterior a este onde muito brevemente introduzi o tema do “DSD” – um acrônimo do termo Dispute System Design cunhado por professores de Harvard para emoldurar um feixe de técnicas e métodos desenvolvidos de forma customizada para solucionar casos complexos seja pela sua natureza, seja pelo número vultoso de partes e interesses envolvidos. Originalmente o DSD foi concebido para solucionar eventos extraordinários e massivos como o programa criado para resolver as inúmeras demandas oriundas do trágico evento das torres gêmeas em New York. Logicamente dentro da premissa de quem pode o mais, pode o menos, o DSD serve não apenas para solucionar lides complexas e com múltiplos interesses, como também pode ser utilizado para resolver conflitos oriundos da rotina normal das corporações e de seus departamentos jurídicos. 

Segundo Frank E. A. Sanders e Robert C. Bordone, em artigo intitulado “Early Intervention: How to Minimize the Cost Conflict”, o DSD é “Um processo que serve para diagnosticar, desenhar, implementar e avaliar um método efetivo de resolução de conflitos dentro de uma organização.” (tradução livre). Em síntese, o DSD é um sistema construído e padronizado para resolver, com ganho de eficiência e menor custo, disputas de forma criativa e colaborativa, dentro das corporações, enfocando mais “os interesses” das partes envolvidas e menos questões de atribuição de “direitos” ou “poderes”. Os autores trazem algumas perguntas para ajudar a construir esse “sistema” tais como: Quais os tipos de disputas surgem tipicamente na sua empresa? Como essas disputas são usualmente manejadas? Se as disputas são tratadas através do reconhecimento de direitos e poderes [ou investigação dos interesses], por que isso funciona assim?

A partir da resposta a essas e outras indagações, o designer buscará fazer um amplo diagnóstico para identificar a causa ou causas dos problemas; sua recorrência; os interesses contrafeitos; quem são as pessoas afetadas pela situação posta e quem seria abarcado pela implementação de um ou vários tipos de procedimentos, positiva ou negativamente. Em suma, uma avaliação mais “holística” dos conflitos e suas possíveis soluções, dentro das corporações, nas palavras de Sanders e Bordone.

Após essa etapa inicial, poderá ser construído em cocriação com os stakeholders da empresa um procedimento que seja capaz de funcionar de forma mais eficaz e, sobretudo, abrangente para resolver um feixe de disputas internas ou externas que costumeiramente aparecem ou que surgem de roldão de forma massificada. Esse modelo poderá abarcar desde intervenções imediatas da área jurídica da empresa ou de gerenciamento de pessoas – mas não apenas nestes setores – para evitar o escalonamento da disputa, até a criação de um ecossistema próprio para a resolução de conflitos já deflagrados. Pode-se, por exemplo, recorrer a meios mais sofisticados como a atuação de profissionais com essa visão holística conhecidos como designers; ou através de mecanismos mais comuns como mediação “on line” ou canais de atendimento ao consumidor; ou ainda com a conjugação de diferentes meios para alcançar a maior quantidade possível de conflitos de forma célere, com elevado ganho de escala e, evidentemente, segura. O DSD, a rigor, não é exatamente uma novidade já que muitas médias e grandes empresas já possuem mecanismos com um viés muito semelhante no que diz respeito a prevenção de litígios. O problema aparece quando essa teia de proteção não é capaz de evitar o surgimento descontrolado de novos casos seja pela ocorrência de uma causa ou causas externas (por exemplo: a recessão econômica decorrente de uma pandemia ou um desastre ambiental) ou gatilhos internos como a mudança do controle ou do estilo de comando da corporação. Certamente nessas situações ao mesmo tempo pontuais e complexas, o estudo da resolução de disputas pode ganhar uma lente de alto alcance e performance quando se aplica tal metodologia de maneira estratégica, consciente e planejada.

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